sexta-feira, 30 de novembro de 2012

Triangulo Feminino (1968) - Robert Aldrich



Aldrich foi um dos cineastas mais autorais e subversivos de sua geração. Deixemos de lado o esporádico Big Leaguer (idem, 1953), no qual já se notava sua pericia técnica - afinal antes de começar a fazer seus próprios filmes, Aldrich trabalhou como assistente de diretor, com não menos que diretores como Chaplin, Renoir, Losey e Ophüls, tendo até sido assistente de Chaplin na direção do clássico Luzes da Ribalta (Limelight, 1952) - logo depois fazendo quatro filmes completamente autorais cujo observa-se claramente a vontade do cineasta em lançar sem pudores sua visão do mundo, completamente idealista e original.

Como não poderia deixar de ser, seu cinema e sua obra não sobrevive sobretudo de polêmica. Em Triângulo Feminino (The Killing of Sister George, 1968), o cineasta conta a história conturbada de um casal lésbico (interpretado pelas atrizes Susannah York [uma beldade falecida em 2011, recorrente ao cancêr] e Beryl Reid) uma cuja perde o emprego na novela que trabalhava na medida que seu conjuge está em plena ascensão e envolvimento com o mundo do show business - o que remonta ao celebre filme do diretor, O Que Terá Acontecido com Baby Jane? (Whatever Happened to Baby Jane, 1962). Não apenas pela relação de ambos os filmes com a fama e a industria do entretenimento, mas também pela temática constante de passado e decadência que se estabelece como um chaga na filmografia de Aldrich.

Não à toa, o que há de mais frequente nos filmes do diretor são as cenas de melancolia e nostalgia vertidas em agressão e violência, no âmago das emoções transformadas nos dramas mais pesados, e em outros casos, até mesmo atingindo a superficie do terror. Para isso, Aldrich não econimiza de cortes secos em direção as linhas de aflição e fúria de seus personagens, apostando na encenação mais crua e ao mesmo tempo mais distorcida que conseguir, para dar mais relevo à força de sua situação e tudo que puder extrair, fazendo mesmo doer a garganta de quem acompanha sua narrativa tortuosa (e geralmente longa que em algumas vezes pode até cair na redundância, apenas para acentuar a dor dos rumos que tomam sua trama [geralmente dominada pelo pessimismo e ceticismo]).

Em todos os filmes dramáticos do diretor (que em grande maioria passeiam entre genêros e possuem a sua mais que patente assinatura) tudo se trata de nada mais que uma estrada fatidica à catarse. Tomando como exemplo sua obra-prima mais insuperável A Morte Num Beijo (Kiss me Deadly, 1955), inicio e fim se intercalam se equivalendo pelo mistério soturno erguendo-se no inicio e que aos poucos vai se revelando através de um ciclo de corrupção, violência e mentiras que passa o detetive - e no mais, como no caso deste aqui, vai rasgando uma cortina de ilusões -, no fim se esclarecendo uma parábola apocaliptica, chegando ao fim da encenação simbólica da Guerra Fria. Então quando George (personagem de Reid) descobre que sua personagem (e por consequência sua carreira) morrerá, temos certeza que não haverá qualquer marasmo daqui pra frente, mas sim uma descarregação raivosa de vingança que caminha a auto-destruição.

O que pode se ver com facilidade em Triangulo Feminino e o deixa um passo acima das obras similares que o cineasta dirigiu anteriormente é sua evolução própriamente como realizador, conduzindo e conciliando com coesão e calma todo o desencadeiamento de acontecimentos e dirigindo todas as cenas mais importantes do filme com timing dramático e cômico com total domínio - o que pode ser um desafio para o diretor em um filme que no inicio parece unilateral e vai abrindo camâdas e inteirando personagens no enredo sem qualquer elipse. Além de definitvamente acertar o tom em uma das suas caracteristicas pioneiras: filmar a loucura em momentos intímos, demolindo seus personagens ao ponto que todos eles estão à mercê dos próprios nervos, vulneráveis ao limite.

Após ter já ter constado seu parecer quanto à moral volúvel e condenável acerca da industrial cinematografica também em A Grande Chantagem (The Big Knife, 1955), o insight aqui é mais satirico. Para isso, Aldrich deixa seus atores todos em afinação - todo elenco está magistral. Beryl Reid encarna o que é uma das personagens femininas mais insuportáveis, engraçadas e definitivamente memoráveis do cinema (a cena em que ela ambula pela festa dos bastidores no estúdio humilhando os produtores é simplesmente perfeita, para aplaudir de pé, tanto que foi indicada ao Globo de Ouro para Melhor Atriz naquele ano), e Susannah York materializa a sensualidade em pessoa (o que dizer da cena lésbica com Coral Browne [com o auxilio daquela trilha sonora desfiando nossos sentidos] ou quando mastiga o tabaco dado pela amante sadicamente para a punir de volta?).

Pode se dizer que Triangulo Feminino é Aldrich no auge de sua forma, agressivo como o cinema de Peckinpah, mas também um artesão sensível e dominador da própria arte; aqui ele finalmente confina mais sabiamente do que nunca o seu melodrama e exploitation, o que tinha em mente se tornou a reprodução certeira, carimbando sua patente extrema de cicatrizar e potencializar histórias inicialmente humanas até o que podem ser.

8,5/10














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