domingo, 17 de fevereiro de 2013

O Lado Bom da Vida (2012) - David O. Russell



Ao narrar a história de um ex-professor do ensino médio que após um incidente desenvolve um distúrbio bipolar, agora lutando para consertar sua vida morando na casa dos pais, David O. Russell se diz comovido e se identificar. O filho do diretor é estudante da escola Devereaux Glenholme, que atende o ano inteiro integralmente pessoas de nove à dezoito anos com vários tipos de déficits. Assistindo O Lado Bom da Vida (Silver Linings Playbook, 2012) fica dificil não levantar algumas questões, nem mesmo entrando na vida pessoal do realizador. Trata-se do profissional em pauta, pouco ou incrívelmente talentoso. Com sucesso, atendendo demandas, assim como Alexander Payne, Jason Reitman, diretores e especialistas em fragrâncias e entorpecentes.

Em O Vencedor (The Fighter, 2010) é mais evidente, ainda há o aspecto urbanista e familiar do cinema de Russell, mas a essência é a mesma, um verdadeiro circo de artifícios. Da mesma forma que o irmão drogado interpretado por Christian Bale, as personagens de Bradley Cooper e Jennifer Lawrence vão zarpando no mesmo mecanismo de reiteração familiar e social, mas na verdade, a luta é com eles mesmos. Russell rejeita os dialogos, para configurar as emoções de seus personagens e do tom que segue o filme basta colocar uma música de fundo durante uma encenação de dança, olhares e sorrisos. Para representar a confusão familiar, arma um espetáculo de histeria, pueril na maioria dos casos, e como no filme todo, todas as ações das personagens não são baseadas nas suas construções como pessoas reais - mas que funcionam como arquétipos práticos -, mas sim para atingir os instintos de quem assiste, depois de x vem sempre y, sempre como previsto. Não há verdade na tela, se há, é pouco, não raro temos a sensação de não estarmos acompanhando uma história de verdade, com excessos de coincidências e transformações.

A apresentação de seres-humanos imperfeitos, os momentos dolorosos e as suas consequencias no agora. Não falta proposta, falta um pouco mais de coração e alma. Mas Russell não faz esforço para sair da mediocridade - no roteiro faz o básico, na direção, enfeita. O elenco, contudo, está bem e adiciona um espirito de espontâneidade que tanto lhe falta. Bradley Cooper está afinado e é bom ator (até que se possa provar mais em um trabalho mais digno), mas assim como Jennifer Lawrence não consegue tirar tanto do texto baratinado - repleto de frases de efeito e definições lacônicas de personalidade. A atriz até consegue hipnotizar com sua presença, disfuncional, agressiva e sensual - mesmo acima do tom em algumas cenas -, apesar de, no fim das contas, sua personagem (uma ninfomaniaca que recebe tratamento chulo que pouco expressa essa condição), é oriunda de tantas do cinema indie norte-americano que surgem através dos anos - enigmática, meio menina, meio mulher, tais como a Summer de (500) Dias com Ela ((500) Days of Summer, 2009) ou a Jordana de Submarine (idem, 2010) - e com todos os pesares, a melhor coisa do filme. Figuras cuja função se reduz à um sedutor objeto de atração, o que nos faz querer constantemente decifra-las, a desmistificar a razão de seu fascínio, o que funciona até certo ponto, como tudo no filme. Já Robert De Niro apesar de expressivo e presente em tela como usual, parece repetir o mesmo papel que faz a anos, com os mesmos cacoestes de um carcamano emburrado e agregado de familia. A atriz Brea Bee, que interpreta a esposa de Bradley Cooper que o traiu, se sai bem em ser paga para aparecer em menos de dois minutos de filme (sem ter foco em nenhum momento), mas afinal em um filme que só faz tirar, seria dificil crer que algo ali poderia ser aprofundado ou acrescentado.

Ir assistir à um filme de Russell é saber que tudo que irá se projetar jamais colocará a mão na lama, ou te surpreenderá com uma cena mais forte, com uma poesia mais elaborada, que todo momento dramático será quebrado por uma piada ou uma solução fácil, que após o fim da tempestade virá a bonança. No fim, os personagens em outrora presos agora conseguem seguir em frente na vida após o climax final  - em um bem-bolado narrativo tão sintético que dão ao filme um triunfo duplo. Como fizeram isso, nunca realmente sabemos, fora um concurso de dança, umas doses de vodka, um olhar e depois uma epifânia, ter tido a sorte das apostas terem dado certo em mais das felizes ocasiões da vida. O que é amargo pouco lhe terá gosto perto das incursões incrívelmente fatidicas e atalhadas do lado bom da vida, de David O. Russell, que em linhas gerais funciona, e lhe trará um sorriso no rosto, mas que ideologicamente, nesse pique nunca passará disso. Mas afinal, o cinema também é feito de ilusão e de mentiras.

6,5/10













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