domingo, 17 de junho de 2012

Delirio de Loucura (1956) - Nicholas Ray



É dificil achar em toda história do Cinema, um cineasta tão cruciante quanto Nicholas Ray (ou qualquer artista). Os seus filmes sempre transcendentais, sua vida marcada dos encândalos mais expositivos e pungentes. O seu nome sempre se traduziu nos sentimentos mais delicados, nos mais profundos complexos, nas situações mais extremas. Pode se ler, ouvir o seu nome, mas é mesmo na tela de cinema que suas multiplices tomam vida, emoção ao mais metafisico sentido da palavra. Sempre tendo aspirações no meio artistico (inclusive tendo sido ator de teatro), parece ter entendido como ninguém o poder das telonas, de sua potência e existência interativa para com o espectador, e através da tecnica cinematográfica, erigiu algumas das experiências mais imersivas e tocantes de toda história do Cinema, de derreterem os mais diversos tipos de publico.

Amargura, medo, incompreensão, amor, fúria. Cabe tudo isso e mais nas fitas realizadas por Ray. O mundo e seus personagem sempre vagando na mesma proporção, as suas lentes observam como no olhar de quem não julga, busca compreensão no âmbito imagético e nos niveis de obliquidade que o mesmo carrega. Em Delirio de Loucura (Bigger than Life, 1956), somos apresentados informalmente ao personagem e a vida do professor Ed Avery (em uma atuação monstruosa de James Mason), pai carinhoso, dedicado e profissional bem relacionado no seu meio. Sua índole à principio hermética é construida de modo raso e preciso, passeando entre cenas, Ray vai estabelecendo superficialmente os esboços de seus personagens. A ruptura dessa formula se dá logicamente quando o personagem de Mason começa a sofrer espécies de desmaios, que o impedem por um breve periodo de tempo de se levantar e se mover. Aparentemente insolucionável sua doença inicialmente, é revelada como um caso tanto raro. Então-lhe é prescrevida uma droga, nova e até então bem-sucedida, de sintomas suspeitos que o transforma (ou revela) uma nova personalidade, de carater violento e auto-confiante, mas que estabelece um paradoxo, tornando seu estado terminal pendente do uso regular do medicamento.

O argumento (e tudo que o precede - sua doeça e posteriormente a droga que deve tomar) servem como subterfúgio para Ray desmistificar seu personagem. A instituição familiar americana (pós-guerra) é retratada (primeiramente também) puramente por esteriotipos: a mulher sorridente e submissa (Barbara Rush) e o filhinho educado (Christopher Olsen). A américa vencedora e organizada, vivendo uma realidade quase ilusória e extremamente artificial. A sua condição subversiva vai revelando à medida que a loucura de Ed vai se desencadeando. No entanto, a loucura de Ed perspassa a trivialidade; em termos mais claros, chega a ser uma loucura consciente. Afinal, das tantas qualidades maravilhosas dos filmes de Nicholas Ray, é sempre admirável à forma de como através das telas, imprimi olhares congruentes por divergentes perspectivas, como em Sangue Sobre a Neve (The Savage Innocents, 1960), faz tal alegoria no paralelo e nas relações entre os esquimos e o homem-civilizado/"moderno". Aqui, para Ed, no seu estado de "loucura" passa a enxergar o ensino escolar de modo totalmente diferente, transformando os alunos em meros "anões morais".

A metamorfose do personagem é realizada de forma não menos que genial. Ao mesmo tempo crasso e pontual, súbito e formal, cada sintôma é explorado impecávelmente. A desordem psíquica (decorrente de uma consequencia quimica neste caso), serve como catalisador para um personagem que passa a ver a vida com outros olhos. Determinante, passa a desprezar a postura insipida do status quo social, mas que em transtornos tetrapolares, oras sente desamparo e medo, que como dito por ele, atinge-se de modo muito mais impactante que a dor fisica. Tudo acentuado pela técnica perfeita da direção sensível e virtuosa de Ray - um dos mais geniais e esfuziantes criadores de mise-en-scene do Cinema; que no breve inicio (e desde já, auge) do Cinemascope, usou como ninguém as angulares amplas e benevolentes que tal recurso possibilitava. Sem precisar ajustar novos planos para diferentes quadros, o efeito de anamorfose o permitia escorar mais objetos em cena e posicionamentos mais ousados de camêra (e também mais movimentação em cena, já que a camêra alcançava mais espaço do que o usual), de tal forma que o enfoque estético só complementava o oficio narrativo. Ed, sua confiança exacerbada e soberania perspicaz em contra-plongée, e seu imponencia penetrante e acuadora no jogo de luzes e sombras permanece como uma das cenas mais poderosas da filmografia de Ray, na cena em que ele entrega um problema matemático para seu filho fazer.

Insinuante e furioso - alguem que perdeu amigos, mulheres (uma cujo flagrou durante relação sexual com o próprio filho menor de idade) e teve a vida enxurrada por escadalos envolvendo adultérios de toda parte homossexualismo e etc... -, conseguiu ainda realizar um poderoso filme e pouco prosaíco (que consegue ser uma proeza). A intersecção que ata real e ficção entra em suma por aqui mesmo, em uma realização artistica das mais ricas e substanciais.















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